
Diante das negativas do governo em
revogar os decretos, sugerindo, inclusive, que existiriam benefícios “de
gaveta”, conforme afirmou o secretário da Fazenda, Paulo Eli, o Parlamento
catarinense agiu e foi decisivo para o desfecho da situação: num acordo entre
os líderes das bancadas partidárias e dos blocos com representação na Alesc,
conduzido pelo presidente do Legislativo, deputado Julio Garcia (PSD), propôs e
aprovou um projeto de lei que prorrogou o início da vigência dos decretos,
previsto inicialmente para abril, para agosto.
A medida, já sancionada pelo
Executivo, ao mesmo tempo em que agradou o setor produtivo, deu tempo ao
governo apresentar, na forma de projetos de lei, a revisão de todos os
benefícios concedidos, conforme determinação do Conselho Nacional de Política
Fazendária (Confaz), válida para os demais estados e o Distrito Federal.
Santa Catarina está há vários anos em
guerra contra outros estados da federação e, mais recentemente, contra países
como o Paraguai. É um conflito que ocorre dentro dos gabinetes, sem o
conhecimento da maioria da população, no qual o objetivo final é a conquista de
investimentos. Trata-se da chamada Guerra Fiscal. E a principal arma atende
pelo nome de benefício ou incentivo fiscal.
Numa explicação simples, o benefício
fiscal pode ser entendido como a concessão, por parte do governo estadual, para
que um determinado produto ou setor da economia tenha condição especial no
recolhimento de um tributo. Na prática, o contribuinte beneficiado, seja ele da
indústria, comércio ou serviços, paga menos imposto. No caso dos estados, o
principal é o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS). Só em
Santa Catarina, ele responde por 80% da arrecadação própria dos cofres
públicos.
Em geral, o benefício fiscal é
concedido na forma da redução da alíquota do ICMS a ser pago, como crédito
presumido ou mesmo com a isenção total no imposto. Ao arcar com uma carga
tributária menor, essa redução poder ser repassada para o consumidor final (com
produtos mais baratos) ou mantida para aumentar (ou manter) a margem de lucro.
O objetivo dessa condição especial é
auxiliar setores produtivos em dificuldade, em decorrência de problemas
pontuais ou mesmo de uma crise econômica. Mas os benefícios fiscais se tornaram
importantes mesmo em períodos de expansão da economia, como uma estratégia para
trazer investimentos para o estado ou mesmos mantê-los por aqui, quando são
assediados por outras unidades da federação.
"O benefício fiscal é uma arma
indispensável", afirma o auditor fiscal da Secretaria de Estado da Fazenda
de Santa Catarina José Antônio Farenzena, que assumirá, a partir de maio deste
ano, a presidência do Sindicato dos Fiscais da Fazenda estadual (Sindfisco).
"Se Santa Catarina não tiver mecanismos de defesa, perde suas indústrias
para outros estados e até mesmo para outros países."
"A possibilidade da concessão de
incentivos fiscais por parte dos estados cria para eles um diferencial muito
importante em relação à captação de investimentos internos e externos. Devido a
isso, essa prática se torna muito importante em caso de uma guerra
fiscal", complementa o presidente-executivo do Instituto Brasileiro de
Planejamento e Tributação (IBPT), João Eloi Olenike.
Critérios
Conforme Farenzena, todos os
benefícios são concedidos com base em estudos elaborados pela área técnica da
Secretaria de Estado da Fazenda. Na maioria deles, são definidas quais as
contrapartidas que o setor beneficiado tem que oferecer ao Estado. "Quase
sempre há previsão [de contrapartida]. É feito um estudo caso a caso. No caso
dos portos, por exemplo, o beneficiado é obrigado a trazer a carga para Santa
Catarina. Neste caso, a contrapartida é o desenvolvimento do local onde o porto
está instalado", comenta.
O dirigente do Sindfisco afirma que
os benefícios concedidos por Santa Catarina para importação foram importantes
na atração de investimentos para as regiões portuárias do estado. "Santa
Catarina não é o principal mercado consumidor do país, mas muitas importações
entram pelo nosso estado e daqui vão para o restante do país."
Conforme a Federação das Indústrias
do Estado de Santa Catarina (Fiesc), a política de benefícios propiciou um
aumento de mais de 370% nas importações catarinenses, que saltaram de 3,4
bilhões de dólares em 2006 para 16 bilhões de dólares em 2014.
Há casos em que não há a necessidade
de uma contrapartida específica para a concessão do incentivo fiscal.
"Alho, suínos, madeira, por exemplo, a manutenção dos empregos, dos
produtores, é a contrapartida", exemplifica.
Os benefícios trazem benefícios para todos?
Ao conceder um beneficio fiscal, o
Estado espera manter ou ampliar investimentos em seu território. Ele abre mão
de uma parte de sua arrecadação para recuperá-la com o aquecimento da economia
ou dos negócios de um determinado setor produtivo. Mas é possível afirmar se
realmente os incentivos resultam em benefícios para toda a sociedade?
O futuro presidente do Sindicato dos
Fiscais da Fazenda do Estado de Santa Catarina (Sindfisco), José Antônio
Farenzena, afirma que os ganhos são, muitas vezes, indiretos. "Quando uma
indústria vem para Santa Catarina, ela vai construir uma planta, vai movimentar
a loja de materiais de construção, vai contratar. Isso gera para o cidadão
comum renda, emprego", diz. "Mesmo se não houver ganho tributário, o
cidadão vai ter emprego. Quando a pessoa tem emprego, tem renda. Ela consume.
Esse consumo se traduz em maior arrecadação de ICMS", prossegue.
A contadora especialista em análise
tributária Vanessa Guesser Alves de Ramos concorda. "Toda uma região acaba
se fortalecendo. O ICMS mais baixo vai permitir que muitas pessoas fiquem
empregadas. E essas pessoas vão consumir. O ICMS está vinculado ao consumo das
pessoas. Quando elas consomem, o ICMS está sendo arrecadado."
Crescimento
Farenzena aponta que a arrecadação de
Santa Catarina com o ICMS entre 2013 e 2018, auge da crise econômica da atual
década, foi a que mais cresceu entre todos os estados do Sul e Sudeste: 53%,
bem superior à média nacional, que foi de 30%. Entre 2003 (quando a política de
incentivos foi intensificada) e 2018, o crescimento foi de 356,6%, o maior
entre os estados do Brasil e bem acima da média nacional (301,4%).
No entanto, esse crescimento, na
avaliação do auditor, não pode ser atribuído apenas à concessão dos benefícios.
"Os auditores fiscais têm trabalhado em ferramentas tecnológicas para
facilitar o recolhimento de tributos e desburocratizar determinadas
situações."
Ele cita como exemplo o sistema de
liberação de importações on-line, integrado com a Receita Federal, que permite
o desembaraço das cargas em até oito minutos nos portos catarinenses. "É
um ganho de competitividade, que implica em resultados positivos na arrecadação
do Estado."
Setor emblemático
Um dos setores mais beneficiados com
os incentivos em Santa Catarina é o têxtil. Por usar mão de obra de forma
intensiva, é um dos que mais gera empregos no Estado, com 170 mil postos de
trabalho, conforme dados da Rais 2016.
As indústrias têxteis catarinenses
foram atingidas pela concorrência com os produtos asiáticos. Além disso, são
constantemente assediadas por outros estados. Para preservá-las em Santa
Catarina, o governo concede crédito presumido de ICMS.
A Federação das Indústrias do Estado
de Santa Catarina (Fiesc) elaborou um estudo em 2018, denominado Incentivos à
Economia, no qual aponta que mesmo tendo recebido em 2016 quase R$ 900 milhões
em créditos presumidos, a manutenção do setor resultou em uma arrecadação
superior a R$ 1,3 bilhão para os cofres públicos estaduais.
"O setor têxtil precisou desse
benefício para se manter competitivo", afirma Vanessa. "Neste caso,
não é só o ICMS arrecadado a mais. Se a indústria migrar para outro estado ou
país, a perda vai ser muito maior que o benefício concedido."
Importações
A Fiesc fez uma comparação entre o
montante de benefícios concedidos e a arrecadação de ICMS por Santa Catarina.
Em 2011, por exemplo, o Estado abriu mão de R$ 4,3 bilhões de receita e obteve
uma arrecadação de R$ 15,1 bi. Em 2017, foram R$ 5,6 bilhões de renúncia para
uma receita final de ICMS de R$ 25,1 bilhões.
Para a entidade, "numa conta
simples: enquanto as receitas cresceram 66% de 2011 para 2017, o volume de
incentivos aumentou apenas 31%, menos da metade."
A Fiesc também destaca que o volume
de incentivos caiu percentualmente com relação à receita de ICMS: em 2011, eles
representavam 28%; em 2017, equivaliam a 22%. "Nesse contexto, também
salta aos olhos da opinião pública catarinense que o que aumenta mesmo, ano a
ano, são as despesas com a folha de pagamento dos servidores públicos do
Estado", ressalta a Federação.
Os papéis da Alesc, Judiciário, MP e Tribunal de Contas
Os benefícios fiscais têm merecido
atenção especial da Assembleia Legislativa de Santa Catarina desde janeiro
deste ano. Em dezembro de 2018, o Poder Executivo editou decretos que retiravam
incentivos para produtos da cesta básica, da construção civil e de outros
segmentos da economia estadual. Procurados pelo setor produtivo e preocupados
com as consequências dessas medidas para a geração de emprego e renda no
estado, os deputados se mobilizaram contra os decretos.
Mas o envolvimento do Parlamento
catarinense com essa questão é antigo. Nos anos 1990, em duas ocasiões, o
Legislativo estadual aprovou projetos de lei que autorizavam o governo
catarinense a tomar as medidas necessárias para defender o Estado na Guerra
Fiscal. Entre essas medidas, estava a concessão de benefícios fiscais.
Na década atual, em virtude
principalmente da queda da arrecadação causada pela crise econômica, e diante
de dificuldades para o pagamento de fornecedores por parte do Estado, surgiram,
no Parlamento, questionamentos sobre a viabilidade da manutenção dos
benefícios.
No ano passado, a Alesc aprovou uma
emenda ao projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2019 que, pela
primeira vez, estabeleceu condições para os benefícios. Primeiramente, toda e
qualquer concessão deveria ser oficializada apenas após a autorização dos
deputados estaduais.
Em segundo, estipulou que o Estado
deveria reduzir até 2022 a renúncia fiscal com os benefícios para, no máximo,
16% da arrecadação. Para isso, uma comissão da Secretaria de Estado da Fazenda
deveria fazer a revisão dos incentivos vigentes.
Em março, após um acordo entre os
líderes partidários, a Alesc aprovou um projeto que adiou para o prazo limite
(31 de julho) a entrada em vigor dos decretos editados pelo Executivo em
dezembro passado. O projeto também revogou o limite para renúncia fiscal com os
benefícios e concedeu até 31 de maio o prazo para a Fazenda entregar a revisão
dos benefícios ao Parlamento.
Justiça
A questão mobilizou também o
Ministério Público Estadual (MPSC). Em janeiro de 2017, o MP ajuizou uma ação
direta de inconstitucionalidade (ADI) no Tribunal de Justiça de Santa Catarina
(TJSC) contra o artigo 99 da lei estadual sobre o ICMS (Lei 10.297/96), que
permitia a homologação dos benefícios fiscais apenas com o silêncio da
Assembleia, sem a necessidade da votação de um projeto de lei.
O Judiciário julgou procedente a ação
em novembro de 2017 e determinou que, a partir de então, todo e qualquer
incentivo só poderia ser concedido com a autorização dos deputados estaduais,
mediante votação e aprovação de projeto de lei específico.
"Essa decisão do Órgão Especial
do Tribunal Catarinense é de enorme relevância e representa mais uma conquista
do Ministério Público do Estado de Santa Catarina, tendo em vista que extirpa
do ordenamento jurídico estadual dispositivo inconstitucional vigente por mais
de duas décadas, pondo fim à prática de concessões de benefícios fiscais
relacionados ao ICMS sem aprovação expressa do Poder Legislativo", afirmou
o procurador de Justiça Durval da Silva Amorim.
Tribunal de Contas
O Tribunal de Contas do Estado de
Santa Catarina (TCE-SC) não determinou ao governo estadual nenhuma revisão ou
convalidação dos incentivos concedidos pela Fazenda. Conforme o diretor da
Diretoria de Controle da Administração Estadual do TCE, Sidney Antonio Tavares
Junior, o órgão, dentro de suas prerrogativas, abriu procedimentos de auditoria
para verificar a questão legal e os resultados obtidos pelo Estado com a
concessão dos benefícios.
"O TCE não demoniza os
incentivos, mas ele tem a missão de verificar se esses benefícios estão sendo
avaliados pelo Executivo, se eles trazem resultados para o Estado",
afirma. "O tribunal não determinou o cancelamento de nenhum benefício, mas
não abre mão de verificar como eles são dados, se as contrapartidas das empresas
são cumpridas."
Tavares Junior explica que a área
técnica do TCE já ouviu o Executivo sobre as justificativas para os benefícios.
Os procedimentos, quando concluídos, serão encaminhados para o Ministério
Público de Contas de Santa Catarina (MPC-SC) e para deliberação dos
conselheiros do tribunal.
De acordo com o diretor, uma das
dificuldades enfrentadas pelo tribunal é a dificuldade no acesso às informações
sobre os benefícios, sob alegação, por parte da Fazenda estadual, de sigilo
fiscal. "Mas o governo que assumiu este ano tem sinalizado uma mudança
nesse sentido."
Setor produtivo defende manutenção dos incentivos
A Agência AL ouviu as principais
entidades representativas do setor produtivo catarinense a respeito do tema
Benefícios Fiscais. Todas foram unânimes em garantir que os incentivos são
necessários para manter o nível de emprego e renda no estado e que sua retirada
traria danos enormes à economia catarinense e à arrecadação tributária.
O presidente da Fecomércio-SC, Bruno
Breithaupt, afirma que os benefícios surgem como uma maneira de corrigir
distorções e estimular a competitividade da economia. "Não se pode abrir
mão dos benefícios, sob pena de comprometer a geração de renda e emprego."
Os setores representados pela federação, conforme o dirigente, recebem 2,4% dos
benefícios concedidos pelo Estado. Mesmo assim, os impactos para a economia
catarinense são relevantes. "As empresas de tradings e atacadistas, por
exemplo, optam por se instalar em Santa Catarina devido à política tributária
vantajosa para estes segmentos em relação aos demais estados do Brasil",
comenta Breithaupt. "Só esses dois setores empregam quase 500 mil pessoas
em Santa Catarina."
Pela Federação das Câmaras de
Dirigentes Lojistas (FCDL-SC), o presidente Ivan Tauffer afirma que os
incentivos fiscais auxiliam os lojistas na manutenção de seus negócios e no
investimento em novas tecnologias, beneficiando a geração de empregos e
receitas para Santa Catarina. "É preciso também manter a concessão de benefícios
dentro de patamares que os iguala aos incentivos dos estados vizinhos, para não
perdermos a competitividade."
Indústria
No ano passado, a Federação das
Indústrias do Estado de Santa Catarina (Fiesc) elaborou um estudo, denominado
"Incentivos à Economia - Mitos e Verdades", no qual defende a
concessão dos benefícios fiscais e rebate os argumentos contrários a essa
política.
A federação considera que os
incentivos são, na realidade, um investimento social, uma vez que o apoio à
atividade econômica mantém ou cria empregos, gera renda e melhora a
arrecadação, que pode ser aplicada nos serviços públicos essenciais, como
saúde, educação e segurança."O problema do Estado brasileiro não reside na
falta de recursos arrecadados por meio de tributos, mas pela má gestão do que
se arrecada e pelo reconhecido gigantismo das estruturas administrativas",
afirma a entidade.
A Fiesc considera que, na falta de
uma política industrial, os benefícios representam uma estratégia fiscal que
primeiramente protegeu alguns setores, mas se consolidou como "ferramenta
de fomento para ampliação e atração de novos empreendimentos." Para a
entidade, tal estratégia foi fundamental para que o Estado não atrasasse o
pagamento dos servidores públicos. "O que parece mais lógico - e
estratégico - é manter os incentivos, fomentar a economia, dar empregos, gerar
renda e, desta forma, aumentar o consumo - fazendo com que a arrecadação cresça
cada vez mais. E, claro, diminuir o tamanho e melhorar a eficiência da máquina
estatal. O que precisa ficar claro é que reduzir os incentivos é também reduzir
a arrecadação."
Agricultura e pecuária
José Zeferino Pedroso, presidente da
Federação da Agricultura e da Pecuária do Estado de Santa Catarina (Faesc),
afirma que retirada de benefícios fiscais é "um golpe duro e desleal
contra o produtor rural e o consumidor urbano." Para ele, tal medida
encarece o preço final dos alimentos, torna os produtos catarinenses menos
competitivos no mercado nacional, aumenta o custo de vida das famílias, além de
impactar na inflação.
A federação também se manifestou
contrária à retirada dos incentivos para os insumos agrícolas. Conforme a
entidade, o custo de produção aumentaria em torno de 25% e seria suportado
quase que totalmente pelo produtor, pois repassar esse aumento para o preço
final tiraria a competitividade do produto catarinense na comparação com os de
outros estados.
Embora a concessão dos incentivos
fiscais tenha resultados positivos, há questionamentos a essa estratégia
adotada pelos estados na briga pela atração e manutenção de investimentos em
seus territórios.
Professor do Centro de Ciências da
Administração e Socioeconômicas da Universidade do Estado de Santa Catarina
(Esag/Udesc), o economista e doutor em Administração Arlindo Rocha estuda o
tema Benefícios Fiscais há mais de 20 anos. Ele reconhece aspectos positivos
nessa estratégia, mas acredita que, ao final, os resultados permanentes para o
poder público e para o setor produtivo não são bons. “O incentivo fiscal, ao
meu ver, é nocivo às economias dos estados e do Brasil. No curto prazo, os
efeitos são positivos, pois há aumento nos investimentos e na oferta de
emprego. Mas a partir do médio e longo prazo, reduzem a arrecadação”, afirma
Rocha.
Outro problema, na avaliação do
professor, é a dependência causada pelos incentivos. Para ele, o mais adequado
seria atacar os vários pontos que comprometem a competitividade da indústria,
com a realização de uma reforma tributária e a redução da burocracia por parte
de governos que “gastam mal e gastam muito. Essa política [dos benefícios
fiscais] eterniza a ineficiência dos setores e cria uma certa dependência”,
afirma o economista. “Por outro lado, nossa carga tributária é extremamente
alta. O melhor para resolver o problema da competitividade é reduzir essa
tremenda carga em cima do setor produtivo, deixar que as empresas entrem em
competição real, inclusive com o exterior.”

Além disso, Rocha lembra que os
municípios são prejudicados, já que 25% do ICMS arrecadado é repartido com
eles. “Se você vai receber menos ICMS, o município também vai receber menos.
Aqueles que não têm nada a ver com a instalação de uma indústria num
determinado lugar vão levar prejuízo.”
O presidente executivo do Instituto
Brasileiro de Planejamento e Tributação (IBPT), João Eloi Olenike, aponta,
ainda, que as políticas de incentivo fiscal podem ser nocivas aos cofres
públicos. Ele considera que seria salutar a criação de limites para a renúncia
fiscal, já que atualmente não há nenhum regramento nesse sentido. “Isso pode
acontecer se a política de incentivo fiscal for mal avaliada em sua concessão e
os seus resultados não trazerem o benefício esperado, causando queda na
arrecadação tributária.”
Ampliar a discussão
Economista do escritório regional do
Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos
(Dieese/SC), José Álvaro Cardoso entende que os benefícios fiscais podem ser
adotados como estratégia de desenvolvimento, mas defende que devem ser
discutidos com a sociedade antes de serem aplicados. “Como são políticas de
grande repercussão social, deveriam ser discutidas com a sociedade,
especialmente com os trabalhadores, que são a esmagadora maioria da população.
Os trabalhadores deveriam ser consultados, também, porque são fundamentalmente
os que geram os impostos arrecadados pelo Estado.”
Por que os benefícios estão em processo de revisão?
Em fevereiro deste ano, o secretário
de Estado da Fazenda, Paulo Eli, afirmou, em sessão especial na Alesc, que o
governo terá que revisar todos os incentivos fiscais e encaminhá-los ao
Parlamento para que eles sejam transformados em lei até 31 de julho. Este prazo
foi estabelecido num convênio entre o Conselho Nacional de Política Fazendária
(Confaz) e os estados, com o objetivo de convalidar e reinstituir os benefícios
concedidos pelas unidades da federação.
Esse processo é uma exigência da Lei
Complementar 160/2017, que estabelece normas para que os incentivos possam ser
mantidos pelos estados. Para isso, eles devem ser apresentados ao Confaz e
posteriormente aprovados pelos parlamentos estaduais.
Em Santa Catarina, a Lei de
Diretrizes Orçamentárias (LDO) 2019 estabeleceu que a Fazenda estadual deveria,
até 2022, reduzir para 16% da arrecadação a renúncia fiscal com os benefícios
(o que foi revogado em março deste ano pelos deputados). Estabeleceu, ainda,
que a secretaria criasse uma comissão para rever os incentivos concedidos pelo
Estado.
“Os governos faziam a concessão por
decreto ou por portaria. Com a Lei Complementar 160/2017 e a decisão do
Tribunal de Justiça sobre o artigo 99, e também por decisão do Confaz, para a
Alesc, não restou alternativa a não ser incluir na LDO a questão dos incentivos
fiscais, trazendo para dentro do parlamento essa questão”, explica o deputado
Marcos Vieira (PSDB), presidente da Comissão de Finanças e Tributação da
Assembleia.
“A Assembleia é a Casa do povo. Aqui
tem que ser discutido tudo que é de interesse da sociedade. Quais os segmentos
que passam a ter direito aos benefícios? Por que trazer outras empresas
oferecendo tratamento diferente? A Alesc tem a competência de julgar qual
segmento terá direito a benefício”, completa o parlamentar.
Déficit
O governador Carlos Moisés da Silva
(PSL), assim que tomou posse, em janeiro, anunciou a revisão dos benefícios
como estratégia para enfrentar o déficit nas contas estaduais, projetado em R$
2,5 bilhões para 2019. “Vamos fazer uma análise criteriosa dessas isenções.
Vamos verificar se o objetivo da isenção foi alcançado. Nosso objetivo não é
quebrar nenhum segmento, até porque o governo depende de todos para arrecadar”,
afirmou Moisés, no dia 2 de janeiro.
No dia 25 de março, quando veio à
Alesc para entregar a proposta da reforma administrativa aos deputados, o
governador reforçou o compromisso com a revisão dos benefícios. “É um processo
que caminha bem. Temos recebido vários setores da economia e ouvido as demandas
para podemos revisar e garantir o que é melhor para o setor produtivo e para o
Estado.”
Opiniões sobre a revisão dos benefícios fiscais
“A Fiesc está de acordo com que a
política de desenvolvimento industrial seja avaliada e ajustada, desde que
ocorra a partir do diálogo com as categorias econômicas representadas pela
entidade. As alterações unilaterais por parte do governo nos incentivos para
fazer frente a gastos públicos desmedidos comprometem o desenvolvimento
econômico, prejudicando toda a população. Tão importante quanto o esforço da
sociedade, é o esforço do governo em reduzir gastos, buscando o equilíbrio das
contas públicas, para fazer frente a tempos de austeridade” . Federação das Indústrias
do Estado de Santa Catarina (Fiesc)
“Concordamos que seja feita a
revisão, desde que acompanhada de uma análise constante e criteriosa sobre o
que os outros estados estão dando de incentivos para manter a competitividade
frente às unidades federativas. A FCDL/SC entende também que a revisão de
incentivos fiscais e as alterações em legislações tributárias devam ser
debatidas com todo setor produtivo e poder público conjuntamente” . Ivan
Tauffer, presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas de Santa
Catarina (FCDL/SC)
“A revisão é positiva, mas terá que
ser feita com mais diálogo entre os setores produtivos afetados e o governo,
visto que o contexto é de competitividade acirrada entre os estados
brasileiros. A medida trará ainda maior transparência aos benefícios fiscais em
Santa Catarina, possibilitando uma distribuição mais eficiente entre os
segmentos produtivos” . Bruno Breithaupt, presidente da Federação do Comércio
de Bens, Serviços e Turismo de Santa Catarina (Fecomércio-SC)
“Sentimos que o atual governo tem
sido muito receptivo ao setor produtivo. Esperamos que efetivamente vença o bom
senso, que se consiga, no diálogo, encontrar o melhor caminho, que não venha a
prejudicar o produtor catarinense” . José Zeferino Pedrozo, presidente da
Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Santa Catarina (Faesc)
“A questão deve ser tratada com
prudência. Manutenção ou revogação deve ser estudada com cuidado, pois afeta
renda e emprego, afeta a segurança jurídica de setores econômicos e a
concorrência deles com outros estados e países. A discussão tem que ser feita
com calma, estudando setor a setor, ouvindo o setor produtivo e a parte
técnica, os auditores fiscais, que analisam os números e conhecem o cenário” .
José Antônio Farenzena, do Sindicato dos Fiscais da Fazenda do Estado de Santa
Catarina (Sindfisco)
“Alguns segmentos econômicos têm, por
lei, incentivos que já duram 15, 16, 18 anos. Normalmente, o benefício é
concedido em razão de uma calamidade ou intempérie, ou em razão de uma crise
financeira, ou ainda para atrair investimentos para Santa Catarina. Fazer a
revisão é necessário. Eu pergunto: será que alguns desses segmentos vão
continuar tendo esse mesmo direito? Cabe a Secretaria da Fazenda propor à
Assembleia e ela aprovar ou não” . Deputado Marcos Vieira, presidente da
Comissão de Finanças e Tributação da Alesc